A pandemia de covid-19 provocou dramas e verdadeiras tragédias na vida pessoal e familiar de milhões de pessoas em todo o mundo. As mazelas econômicas, que inevitavelmente se entrelaçam com as nossas vidas pessoais, não ficaram atrás, dizimando empresas dos mais variados segmentos econômicos que sofreram com o isolamento social, lockdowns, mudança de hábitos dos consumidores, perda de poder aquisitivo e a espiral inflacionária causada em grande medida pelo desarranjo das cadeias produtivas internacionais.
As empresas dedicadas a eventos talvez tenham sido as mais prejudicadas em nosso país. Casas de espetáculos foram fechadas, teatros e cinemas; feiras e congressos cancelados; os turistas, confinados em suas casas, deixaram de viajar, entre tantos e tantos outros exemplos.
Atento ao risco de absoluta e irreversível destruição de milhares de empresas atuantes em tal relevante setor econômico, em enorme prejuízo a todo o país, o Congresso Nacional aprovou a Lei nº 14.148, publicada no Diário Oficial da União de 04.05.2021, que instituiu o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos – PERSE contemplando medidas em socorro de empresas e, naturalmente, de empregos.
Em razão do parcial veto presidencial ao texto original da lei aprovada pelo Congresso Nacional e da sua posterior derrubada em março de 2022, o PERSE viveu dois momentos distintos no que diz respeito às suas medidas tributárias. Primeiramente, em maio de 2021 ele aprovou uma modalidade específica de transação que permitia aos seus beneficiários condições vantajosas para o parcelamento de suas dívidas tributárias.
Quase um ano depois, em março de 2022, a Lei nº 14.148/21 foi republicada para incluir outros dispositivos inicialmente vetados. O principal deles, expresso no artigo 4º da Lei, reduz a zero, pelo prazo de cinco anos, a alíquota de PIS, COFINS, IRPJ e CSLL devidos pelas empresas consideradas integrantes do setor de eventos.
As empresas integrantes do setor de eventos para fins do PERSE são assim definidas por um conjunto de normas: o artigo 2º da própria Lei nº 14.148/21, o artigo 21 da Lei nº 11.771/08 e a Portaria ME nº 7.163/21. As locadoras de veículos foram contempladas (inegavelmente aquelas dedicadas ao rent a car, mas não necessariamente apenas estas) e, portanto, observadas as condições e requisitos estabelecidos pela legislação, podem aproveitar-se do benefício tributário em questão.
Não se trata de aplicação imediata e automática da alíquota zero a toda e qualquer locadora, destacando-se, entre outros requisitos, a exigência contida na Portaria ME nº 7.163/21 de que elas estivessem inscritas no Cadastur antes de 04.05.21.
No entanto, mesmo as locadoras inscritas posteriormente àquela data ou que ainda venham a inscrever-se poderão, judicialmente, buscar o reconhecimento do seu direito à alíquota zero.
Afinal, por que duas locadoras com mesma atuação comercial e que enfrentaram as mesmas dificuldades impostas pela pandemia conviverão ao longo de cinco anos com realidades tributárias completamente distintas apenas por conta de uma inscrição singela no Cadastur feita antes ou depois de 04.05.21?
É recomendável, com inscrição prévia no Cadastur ou feita após 04.05.21, avaliar a legislação com imparcialidade, sem a influência que o interesse próprio no benefício tributário poderia exercer, a fim de que ele apenas seja aproveitado por esta ou aquela locadora se realmente estiver convencida de que todos os requisitos legais são cumpridos e, havendo necessidade de recorrer ao Poder Judiciário, para a implementação de estratégia processual segura e isenta de riscos.
Como bem definiu o ex-ministro da fazenda Pedro Malan, no nosso país até o passado é incerto. Assim, é preciso ter ainda maior cautela com o presente e o futuro, especialmente quanto às regras tributárias, tão sujeitas aos humores das nossas autoridades de plantão e às suas necessidades, maiores ou menores, de arrecadação, bem como ao crivo do Judiciário.
Mas a alíquota zero ao longo de cinco anos está aí. Expressa na legislação e com possibilidades reais de beneficiar as locadoras de veículos. A oportunidade de mitigar os danos econômicos causados pela pandemia e assegurar a sobrevivência de tantas locadoras que tiveram de endividar-se para sobreviver é muito grande e merece ser examinada com atenção e sob orientação dos profissionais da confiança de cada uma delas.
*Dr. Luiz Pamplona é sócio do escritório Dias e Pamplona Advogados